Vivemos num
país cada vez mais pobre…
Visitei, por mero
acaso, uma casa decrepita, onde 88 anos se arrastam por entre trouxas de roupa
esquecidas em todos os cantos e moveis antigos cobertos de lixo e memórias, que
me dizem que noutro tempo a vida foi bem diferente.
Acompanhei uns
colegas que iam levar comida a um cão abandonado e dei comigo num lugar que me
deixou um aperto no coração.
Construímos muros
enormes, onde aprisionamos almas que habitam em corpos de velhas viúvas e
homens velhos perdidos. São casas tão velhas quanto os seus inquilinos, que
desmoronam ao mesmo tempo que a vida se apaga lentamente na solidão do seu
abandono.
Vivem em lugares
onde passamos todos os dias, sem que imaginemos que atrás daquelas paredes
existem seres esquecidos. Casas que são becos frios húmidos e sujos, de paredes
altas e vazias que se erguem como mortalhas onde vão morrendo todos os seus
sonhos e aos poucos se apagam também as memórias.
É este o mundo que
construímos e talvez o futuro de muitos de nós.
Temos lições a
tirar até mesmo da mais paupérrima miséria.
Foi esta velha
senhora que acolheu o cão que alguém abandonou à sua sorte. É ela também que
deixa entrar para se sentarem ou dormirem os sem-abrigo que vagueiam nas ruas.
Lá estava um velho
e sujo colchão pronto para alguém que por lá apareça e sentados num canto dois
olhos humanos, perdidos num rosto imundo e cheio de pêlos.
Talvez seja o cão o
salvador de quem lhe abriu os braços, pois a senhora por não poder andar, pediu
ajuda para o passearem e foi assim que relataram o caso à segurança social.
Este é apenas mais
um caso dos muitos e tristes que vou conhecendo.
Sou abordada nos supermercados
por gente com fome. Pessoas com vergonha de pedirem e que ao fim do dia nos
dizem que um iogurte já era bom, porque estão em jejum. Fui beijada outro dia, entre
lágrimas de gratidão porque fui solidária, com alguém cansado de bater a muitas
portas sem que tenha tido resposta. Há casas sem água, luz ou gás, porque os
seus habitantes estão desempregados.
Este é o panorama geral
do país.
Mas nas notícias a
crise passou…e o desemprego diminuiu.
Não contam para os números
os velhos que morrem por falta de assistência, os muitos homens e mulheres que
vagueiam pelas ruas porque sem trabalho lhes foram roubadas as casas, a família
e a dignidade.
Não contam os que
perderam o direito a estar inscritos no serviço nacional de emprego, porque o
tempo acaba e eles deixam de fazer parte dos números e passam a ser “pedintes
envergonhados”.
Nem contam os
muitos que foram obrigados e emigrar, para conseguirem sustentar os que deles
dependem, deixando assim o vazio de se criar uma família sem pai.
A crise não passou –
pelo contrário ela cresce todos os dias em muitos dos nossos lares, perante a
nossa passividade e a impunidade dos que muito mal nos governam, mas muito bem
se governam.
Vivemos num país
cada vez mais pobre, mas que meia dúzia anuncia ao mundo,
Como cada vez mais
rico.
Benvinda Neves
Novembro
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